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domingo, 29 de julho de 2012

SAÚDE: Lesões no Desporto


Por: Antonieta Dias (*)
Apesar da melhoria e progressos nos processos de treino, nos equipamentos e nas técnicas cirúrgicas, e independentemente do nível de capacidades ou experiências, ninguém que participe em competições ou em programas de actividade física está imune ao risco de lesões (Gould e Udry, 1994).
A área de investigação que mais tem contribuído para o estudo dos factores psicossociais de risco nas lesões desportivas é, sem dúvida, o estudo do stress associado aos acontecimentos da vida dos atletas e a sua relação com a ocorrência de lesões (Heil, 1993; Pargman, 1993; Williams e Roepke, 1993).
A interacção entre os componentes cognitiva e fisiológica da resposta ao stress, sobretudo em situações desportivas geradoras de elevados níveis de stress, influencia em maior ou menor grau a probabilidade de ocorrência de lesões. No que se refere à avaliação cognitiva das lesões desportivas geradoras de stress (ex: competição, treino, titularidade, etc.), tal avaliação pode, por vezes, originar ou produzir respostas emocionais inadequadas ou desajustadas que, por sua vez, podem predispor um atleta para um maior risco de lesões. Tal deve-se, em grande parte às mudanças fisiológicas e atencionais que acompanham as avaliações cognitivas de carácter negativo.
A presença de reacções emocionais negativas ou desadaptativas interfere assim no bem estar psicológico dos atletas lesionados, mas também pode interferir na reabilitação da lesão e nos níveis de aderência, adesão e motivação adequadas às tarefas e actividades de reabilitação. Por isso Buceta (no prelo) refere a importância de prestar atenção à natureza stressante das lesões desportivas e salienta a necessidade de considerar os vários aspectos e momentos do stress pós-lesão: o stress da hospitalização e das intervenções cirúrgicas, o stress na reabilitação das lesões, o stress no regresso à actividade desportiva habitual, o stress dos atletas lesionados, que têm de competir nesse estado e o stress dos atletas lesionados que são obrigados a abandonar a prática desportiva. Não se pode assim dizer que é apenas a presença de stress que contribui para aumentar a vulnerabilidade às lesões desportivas. Estas, por sua vez, podem também aumentar a vulnerabilidade à experiência do stress.
As lesões constituem um dos obstáculos mais significativos ao rendimento bem sucedido em contextos desportivos. Sendo virtualmente uma preocupação diária no desporto, os efeitos das lesões no bem estar psicológico dos atletas e no rendimento posterior são bem evidentes. Paralelamente, a capacidade de resistir às lesões e de recuperar rapidamente quando se está lesionado é um factor importante e decisivo na longevidade desportiva e no sucesso dos atletas (Heil, 1993).
Em face do elevado tempo, energia e esforço dispendidos pelos atletas para a obtenção de níveis máximos de rendimento, uma lesão pode constituir muitas vezes um acontecimento traumático da vida, com consequências físicas e psicológicas imprevisíveis.
Recentemente, vários estudos têm documentado a importância atribuída por treinadores e atletas aos aspectos e factores psicológicos na reabilitação e recuperação das lesões (v.g., Levleva e Orlick, 1991; Wiese e Weiss, 1987).
Posteriormente, Booth (1987) estimou em cerca de 17 milhões o número de lesões desportivas que ocorriam anualmente entre os atletas americanos.
Simultaneamente, um estudo de Mueller e Blyth (1987), considerando apenas a modalidade de football no ensino secundário dos EUA, apontava para 10 mortes, entre um milhão de lesões por ano. Do mesmo modo, Zemper (1989) referia que quase um em cada dois atletas universitários de football americano sofria de uma lesão grave que o impedia de participar na competição.
Paralelamente, Booth (1989) apresentava dados que indicam que, em cada ano, um terço dos cerca de 15 milhões de joggers dos EUA apresentavam lesões músculo-esqueléticas.
Por sua vez, Hardy e Crace (1990) referem que, anualmente, e só nos desportos amadores dos EUA, quase metade de todos os participantes em actividades e práticas desportivas sofre uma lesão que os impede de participar ou competir (um quarto destas lesões exige pelo menos uma semana de inactividade total). Talvez por isso, Boice e Sabolewski (1989) consideravam que a incidência de lesões era tão séria nas crianças, adolescentes e adultos, que as lesões substituíram as doenças infecciosas como principal causa de morte ou deficiência.
Heil (1993) salienta que, para além das lesões físicas, os atletas “arriscam-se” a outras “lesões” médicas e psicológicas, em consequência da sua participação na prática desportiva. O síndrome da sobrecarga de treino, as desordens da alimentação e o abuso de drogas exemplificam bem tais consequências: “elas têm um impacto directo na saúde e no rendimento e, por sua vez, aumentam o risco de lesão física” (p.5). Estas lesões têm os seus custos financeiros e pessoais e limitam o potencial sucesso desportivo.
No entanto, e apesar dos avanços tecnológicos na segurança dos equipamentos e na melhoria da metodologia do treino, as lesões continuam a aumentar em todos os desportos (Hanson, McCullagh e Tonymon, 1992).
A gravidade das lesões desportivas tem levado, na última década, muitos investigadores no domínio da Medicina e da Psicologia Desportiva a abordarem este problema.
De entre a literatura existente, salienta-se um crescente número de estudos e trabalhos sobre os aspectos e factores psicológicos associados às lesões desportivas e sua reabilitação e recuperação (ver Heil, 1993: Pargman, 1993; Williams e Roepke, 1993). Embora sem dúvida alguma, alguns factores de natureza física e diversos factores de ordem psicológica parecem contribuir também para uma maior predisposição e/ou vulnerabilidade às lesões, muito temos ainda que investigar, para aprofundar e fundamentar os conhecimentos.
Em suma, no trabalho de recuperação da lesão, é fundamental a avaliação de determinadas variáveis extremamente importantes no processo. Para além da avaliação da lesão, do seu impacto emocional e da dor associada, no período pós-lesão é importante avaliar também variáveis como a adaptação e aderência ao programa de reabilitação, progresso terapêutico, certas variáveis desportivas e a tendência do atleta para o evitamento ou “fuga”.
É dever do médico especialista em medicina desportiva, empenhar-se no programa de reabilitação e no acompanhamento do atleta lesionado, de forma a minimizar ou impedir que uma lesão se torne num insucesso da sua carreira desportiva.
(*)  Doutorada em Medicina

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